Perigosas bactérias contaminaram
as águas consumidas pela população de Aparecida de Goiânia – as
de cisternas e as fornecidas pela Saneago. Cerca de 60% delas são
consideradas impróprias para o consumo humano porque podem causar
doenças graves e até mortais.
A denúncia é do Ministério
Público e está embasada em centenas de análises feitas pelo
Laboratório de Saúde Pública Dr. Giovanni Cysneiros (Lacen/GO). O
MPE acusa pela contaminação a Saneago, Prefeitura, o Estado e a AGR
– Agência Goiana de Regulação, Controle e Fiscalização de
Serviços Públicos.
Os
Laudos Insatisfatórios do Lacen revelam que na maioria das águas de
Aparecida, inclusive nas fornecidas pela Saneago, existe a perigosa
bactéria
Escherichia Coli. A
presença dessa bactéria indica contaminação fecal, e nesse
estágio, a água provoca doenças que levam a morte.
O caso resultou em processo do
Ministério Público contra a Saneago, Prefeitura, o Estado e a AGR.
A Ação Civil Pública foi proposta pelo promotor de Justiça Élvio
Vicente da Silva, da 9ª Promotoria de Aparecida (Defesa do
Patrimônio Público, Consumidor e Difusos).
A
farmacêutica bioquímica Marlúcia Catúlio disse em depoimento ao
promotor Élvio Vicente, que a situação de Aparecida é de alerta e
que o município detém o nível mais alto de contaminação em
Goiás. Segundo ela, quando a Escherichia
Coli é
encontrada na água, o produto já está infectado por inúmeras
outras bactérias.
Todas
as amostras coletadas pelo Lacen nas águas de Aparecida acusam a
existência da bactéria Escherichia
Coli,
e por isso, a água não poderia estar sendo ingerida pelas pessoas.
“A situação é de calamidade”, alerta o promotor de Justiça.
As doenças do descaso
O
promotor Élvio Vicente constatou que mais de 80% da população de
Aparecida não possui rede de esgoto e é obrigada a conviver com o
mal cheiro exalado das fossas, ficando a mercê de doenças e mortes
provocadas pelas águas infectadas das cisternas.
Ele afirma que em vários bairros,
a água consumida pelo povo é extremamente nociva a saúde. A sua
conclusão é comprovada por depoimentos de moradores e centenas de
laudos enviados a 9ª Promotoria de Justiça e anexados ao processo.
Os esgotos a céu aberto colocam a
população em constante risco de contrair doenças como a diarréia,
desidratação, hepatite 'A', esquistossomose, febre tifóide, febre
paratifóide, amebíase, ascaridíase e cólera, dentre outras. O
meio ambiente também é vítima, pois rios e peixes estão morrendo
vitimados pela contaminação.
A omissão da Saneago na prestação
de serviços obrigou os aparecidenses a fazer cisternas e fossas
provisórias e elas contaminaram todo o lençol freático da cidade,
provocando graves danos a saúde e ao meio ambiente, afirma Élvio
Vicente. Vale lembrar, a empresa de saneamento tem a concessão dos
serviços a três décadas.
O processo que une na condição
de réus a Saneago, Prefeitura de Aparecida, Estado e AGR teve início
depois que diversos presidentes de bairros procuraram a 9ª
Promotoria de Justiça para denunciar a péssima qualidade da água
consumida nas regiões que eles representam.
O promotor de Justiça instaurou
Inquérito Civil Público, confirmou as denúncias pelas análises,
propôs a Ação Civil Pública e nela, ele é categórico quando
afirma: “É um absurdo a situação a que estão submetidos os
moradores de Aparecida, “obrigados a tomar água contaminada por
bactéria indicadora de contaminação fecal”!
Jovem
ficou cega e
culpa contaminação
A presidente da Associação das
Mães do Village Garavelo II, Jorgina Maria das Dores, denunciou ao
promotor Élvio Vicente que uma moça moradora do bairro ficou cega
de um olho por causa de um caramujo que vive na água.
No setor Morada dos Pássaros,
pessoas contraíram diarréias e dores de estômago por ingerir água
infectada. O Controle de Zoonoses e Vigilância Sanitária atestam
que de sete amostras de água do setor, seis não atendem aos padrões
bacteriológicos de potabilidade.
Dez amostras de água do bairro
Residencial Norte Sul foram examinadas pela Universidade Federal de
Goiás. O resultado é assustador: todas foram consideradas
impróprias para o consumo, pois um lixão existente no setor
Caraíbas contaminou o lençol freático da região.
Segundo o presidente do bairro
Cardoso II, o esgoto do setor é a céu aberto e os dejetos dele vão
direto para o Rio Tamanduá, que está infectado. A falta de
saneamento causa a proliferação do mosquito da dengue e o risco de
contaminação de várias doenças.
No bairro Mansões Paraíso, onde
a Saneago também não implantou rede de esgoto, os dejetos de
cozinha e de vasos sanitários são lançados diretamente nas ruas.
Élvio Vicente afirma, a situação é grave em praticamente todos os
barros de Aparecida, inclusive no centro da cidade.
Saneago monopoliza o sistema
A Saneago, que possui concessão
para implantar redes de água tratada e de esgoto no município por
mais 30 anos – a três décadas ela detém o monopólio dos
serviços –, é acusada de inércia e morosidade, pois a maioria
dos bairros não dispõe do sistema e onde ele existe, funciona de
forma precária.
Segundo depoimentos de presidentes
de bairros, o serviço prestado pela empresa é defeituoso, falta
água constantemente e quando ela volta, desce suja e barrenta,
totalmente sem condições de ser ingerida.
Os aparecidenses ouvidos no
Ministério Público dizem que quando a Saneago quebra o asfalto para
consertar canos, não o recupera, deixa os moradores sofrendo com as
ruas esburacadas e não indeniza ninguém pelos transtornos.
Os cortes no fornecimento de água
pela Saneago faz aumentar a conta no final do mês. O esquema ocorre
porque a rede fica com ar comprimido, fazendo girar a rotação do
medidor mesmo sem o uso da água.
Canos estourados, tubulação
inferior que não resiste a pressão da água são algumas das
centenas de reclamações feitas contra a Saneago no MP. Em muitos
bairros onde existe rede de água tratada, ela também está
contaminada, conforme os Laudos Insatisfatórios do Lacen.
Cobrança de tarifa
pode
ser suspensa
O MP requer, via liminar, que a
Saneago pare de cobrar a conta de água dos consumidores, enquanto o
produto for considerado impróprio para o consumo. Se o Judiciário
atender o pedido, a cobrança da tarifa fica suspensa até que a água
seja descontaminada.
O promotor Élvio Vicente quer que
a Saneago, Prefeitura, Estado e a AGR sejam condenados a pagar no
mínimo R$ 1 milhão de indenização por danos morais coletivos. Ele
entrou com pedido de liminar requerendo a elaboração, em seis
meses, de um plano de saneamento básico, com a participação dos
presidentes de bairros.
O
projeto visa dotar 100% da cidade com rede de água tratada e de
esgoto e deve ser executado em menos de dois anos. Élvio Vicente
requer ainda a implantação e o funcionamento, em caráter de
emergência, da Estação de Tratamento de Esgoto – ETE.
Outro pedido na Ação objetiva
que a Prefeitura trabalhe em conjunto com a Saneago para implantar
serviços de infraestrutura em todo o município, incluindo drenagem
pluvial, coleta, afastamento e tratamento de esgoto. O promotor
requer urgência em todas as medidas a ser adotadas para solucionar a
situação, que ele qualifica de caótica.
O Procon deverá ser notificado
para acompanhar o andamento do processo e tornar pública todas as
ações da Saneago e da prefeitura de Aparecida. A “Ação Civil
Pública de Obrigação de Fazer” tramita na Vara da Fazenda
Pública sob o número 278692-24.2010.
Prefeitura contesta
processo
do MPE
O secretário de Infraestrutura de
Aparecida, Mário Vilela, alega que a Saneago, por ter a concessão
dos serviços, é a responsável não só pela implantação de rede
de água, como também tem toda a responsabilidade sobre a qualidade
do produto fornecido a população aparecidense.
Mário Vilela afirma ainda que,
devido os serviços estarem a cargo da Saneago, a prefeitura não
pode responder a nenhuma Ação Civil Pública por falta de rede de
água ou pela contaminação delas.
O
secretário informa, contudo, que a Agência de Saneamento de
Aparecida – ASA, órgão criado no ano passado pelo prefeito
Maguito Vilela, está responsável pela
fiscalização dos serviços e regulamentação da área de
saneamento básico. Cabe a Agência fiscalizar inclusive a atuação
da Saneago em Aparecida.
Por
que o povo aparecidense é obrigado tomar água infectada pela
bactéria Escherichia
Coli,
indicadora de contaminação fecal, conforme provam centenas de
análises em poder do MPE?
Mário
Vilela – A
responsabilidade
sobre esse problema é totalmente da Saneago, já que é ela quem
fornece a água e faz todo o tratamento do produto antes de levar à
casa do consumidor. É evidente que estamos preocupados com essa
situação e o prefeito Maguito Vilela (PMDB)
já cobrou providências da Saneago, não apenas quanto à qualidade
da água, como também em relação à extensão das redes de água
de forma a atender toda a população, e não apenas os 68% dos
moradores que atualmente são beneficiados com o serviço.
A
ACP do MPE, movida também contra a Saneago, o Estado e a AGR, requer
que a prefeitura implante saneamento básico em 100% da cidade, em
menos de dois anos. É possível cumprir essa determinação, se o
Judiciário atender o pedido do Ministério Público?
Mário
Vilela – O
prefeito Maguito Vilela está determinado em levar água tratada e
esgoto sanitário para 100% da população do município. Ele já
esteve com o presidente da Saneago em várias oportunidades para
cobrar a extensão do serviço, já que, legalmente, é a estatal
quem está com a concessão do saneamento básico na cidade.
A
prefeitura pensa em retirar a concessão da Saneago, que detém o
monopólio dos serviços a 30 anos e renovou contrato na
administração passada para continuar atuando por mais 30 anos no
município?
Mário
Vilela – A
Saneago opera o serviço no município desde 1974, quando a Lei
Municipal nº 98/74 autorizou a outorga do serviço de água e esgoto
na cidade. A concessão foi renovada em 2005, ou seja, na
administração anterior à do prefeito Maguito Vilela.
Entretanto,
sabendo das dificuldades da estatal em atender toda a demanda da
população, o prefeito Maguito criou no ano passado, com a aprovação
da Câmara Municipal, a Agência de Saneamento de Aparecida (ASA),
que é uma autarquia municipal responsável pela fiscalização dos
serviços e regulamentação da área de saneamento básico,
incluindo a atuação da Saneago com a demanda da necessidade dos
moradores.
Além
de criar a ASA, o prefeito Maguito Vilela, juntamente com os
prefeitos de Rio Verde, Luziânia, Jataí e Trindade, cujas cidades,
em comum possuem uma grande densidade populacional e baixos índices
na área de saneamento, se reuniram com o presidente da Saneago e
cobraram os investimentos necessários para levar a água tratada e o
esgoto sanitário para toda a população.
O
presidente da Saneago prometeu atender as reivindicações dos
prefeitos. No
caso específico de Aparecida, se a estatal não atender as demandas
da população, o prefeito Maguito Vilela poderá interromper a
concessão e realizar o serviço de saneamento básico pelo próprio
município, por meio da nova Agência de Saneamento de Aparecida.
Por
que grande parte da população não conta com rede de esgoto e de
água tratada, se todos pagam impostos?
Mário
Vilela – Os
impostos municipais, como o IPTU, o ITR, entre outros, não incluem
os serviços de saneamento básico. A água tratada e o esgoto
sanitário são pagos pelo consumidor conforme a demanda de cada
família. A tarifa é estipulada pela própria Saneago, conforme
autorização da agência nacional do setor.
Aparecida
de Goiânia é o segundo maior município do Estado em população,
com mais de 530 mil habitantes, porém é o quinto em arrecadação.
É notório que os recursos do município não são suficientes para
atender toda a demanda que a população necessita.
Falta
dinheiro no caixa da prefeitura para implantar esses serviços
básicos e essenciais para uma boa qualidade de vida?
Mário
Vilela – A implantação do saneamento básico no município é
realizada com recursos de financiamentos de diversos organismos
financeiros, como a Caixa Econômica Federal, Banco do Brasil, entre
outros. Os investimentos são pagos ao longo do tempo por meio da
exploração do serviço.
Mesmo
com as dificuldades econômicas, conseguimos realizar grandes obras
de infraestrutura, como pavimentação asfáltica, construção de
pontes de bueiros, escolas, galerias de água pluvial, construção
de praças, entre outras, que tem melhorado a qualidade de vida da
população. (sic).
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