15 de março de 2013

Marconi colocou Goiás a serviço de Cachoeira



A Polícia Federal acusa o governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), de ter transferido o comando da Segurança Pública ao bicheiro Carlinhos Cachoeira, e de ter sido peça fundamental para o bom êxito das atividades criminosas do mafioso no Estado

Operação Monte Carlo

O governador Marconi Perillo (PSDB) colocou a estrutura administrativa de Goiás – principalmente a do setor de Segurança Pública – aos pés do bicheiro Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira. A denúncia é da Polícia Federal e do Ministério Público federal, que acusam o tucano de ter transformado o Estado em território livre para o mafioso agir na exploração ilegal dos caça níquéis e do jogo do bicho.
Depois de afundar politicamente o ex-senador Demóstenes Torres, a cachoeira de corrupção atinge em cheio o Governador, seus principais secretários e aliados políticos. Segundo o relatório da PF, o esquema criminoso recebia proteção de Marconi, com direito até a assessores de alto escalão antecipando as operações policiais para o bicheiro.
No governo de Marconi, Carlinhos Cachoeira dava as cartas não só na Segurança Pública – área onde mandava nomear e exonerar delegados a seu bel prazer – como também tinha grande influência na Secretaria de Indústria e Comércio. Ele transformou a Pasta em cabide de emprego e colocou seis parentes trabalhando lá.
O ex-vereador e ex-presidente da Câmara Municipal, Wladmir Garcês, preso junto com Cachoeira, também tinha parentes mamando nas tetas da Secretaria de Indústria e Comércio. Garcês é amicíssimo de Marconi e era quem intermediava as negociações entre o governador e o bicheiro, através de torpedos trocados pelo celular.
Carlinhos Cachoeira foi preso no dia 29 de fevereiro passado, morando na mansão que até 2010 pertencia ao governador Marconi, situada no Alphaville Ipês, em Goiânia. O bicheiro e mais de 30 cúmplices foram pegos pela Operação Monte Carlo deflagrada pela Polícia Federal, em conjunto com o Ministério Público Federal e o Escritório de Inteligência da Receita Federal.
A deflagração da Operação Monte Carlo e a prisão do bicheiro resultou no  sepultamento político de Demóstenes Torres,  pressionado a se expulsar do DEM, ficou sem partido e teve o mandato assado. Marconi está na berlinda e a exemplo do que aconteceu com Torres, a cada explicação que divulga, ele se complica mais.

Bicheiro teria bancado campanha de Perillo
Corre a boca miúda nos bastidores políticos de Goiás e de Brasília que o bicheiro teria jogado muito dinheiro na campanha eleitoral de Marconi em 2010. Fato é que um dos envolvidos com Cachoeira é Jayme Rincón. Presidente da Agetop - Agência Goiana de Transportes e Obras, Rincón foi um dos principais arrecadadores de dinheiro para a campanha do tucano. Ele pediu demissão do cargo.
A notícia que Marconi recebeu dinheiro do bicheiro na eleição para governador fica mais consistente quando a Polícia Federal aponta Wladimir Garcez também como arrecadador de grana para a campanha de Perillo. O ex-vereador era um dos braços direito de Carlinhos Cachoeira e foi preso com ele.
Curiosamente, depois de eleito Marconi jamais importunou o mafioso e cabia a Garcês – o amigo de Marconi e de Cachoeira – repassar informações sigilosas ao bicheiro sobre as ações do grupo tático (GT3), a unidade de elite da Polícia Civil.
Além de Wladmir Garcês, outras pessoas ligadas diretamente ao Governador – a exemplo da sua ex-chefe de gabinete, Eliane Pinheiro – eram incumbidas de também informar a Cachoeira qualquer ação policial de repressão a jogatina ou outra atitude da Polícia que pudesse atrapalhar as atividades criminosas da quadrilha em Goiás.
Eliane Pinheiro pediu demissão do cargo de chefe de gabinete e alega ter sido confundida pela Polícia Federal com outra pessoa de mesmo nome. Balela, a PF tem o nome dela completo, o seu número de telefone e o número de seu CPF. Tá tudo divulgado no relatório das investigações.

Ligações Perigosas
Para a Polícia Federal, Cachoeira pagava regularmente aos integrantes do governo Marconi Perillo para ter acesso a informações de interesse financeiro ou político da organização criminosa. Nas transcrições da PF, Eliane Pinheiro, então chefe de gabinete de Marconi, troca inúmeros telefonemas e torpedos com Carlinhos Cachoeira.
Numa das conversas, Eliane informa ao bicheiro quais as prefeituras de Goiás estavam na mira da Operação Apate, que investigou em 2011 fraudes tributárias nos municípios do Estado. Um dos privilegiados com as informações sigilosas repassadas por Eliane é o prefeito Geraldo Messias (PP), de Águas Lindas de Goiás, aliado político de Marconi.
Por telefone, ela avisou ao prefeito Geraldo que haveria uma operação de busca na casa dele. A ex-chefe de gabinete, também “inocente” no esquema Cachoeira, diz que foi só por “amizade” que repassou a informação sigilosa ao prefeito Geraldo Messias.
Assim como Demóstenes Torres, Eliane Pinheiro também usou um rádio Nextel comprado por Cachoeira nos Estados Unidos e habilitado em Miami. Segundo a Polícia Federal, apenas as 14 pessoas de extrema confiança do bicheiro usavam esse tipo de telefone.
Ou seja, a chefe de gabinete do Governador integrava o grupo dos 14 que formavam a cúpula da organização criminosa chefiada por Carlinhos Cachoeira e Marconi não sabia de nada? A versão do Governador segue a linha adotada por Demóstenes Torres, sobre o amigo bicheiro: “Eu pensei que ele tivesse abandonado o crime” (sic).
O juiz Paulo Augusto Moreira Lima, da 11ª Vara Federal de Goiânia, frisa na sua sentença determinando a prisão do bicheiro, “é assustador o alcance dos tentáculos da organização criminosa comandada por Cachoeira e a influência dele na nomeação de dezenas de pessoas para ocupar funções públicas no Estado de Goiás”. Marconi jura que não sabia nada disso.
Muita água suja ainda vai rolar de Cachoeira – ele está preste a aceitar o acordo de delação premida ofertado pelo MPF –, mas as transcrições dos diálogos telefônicos feitos pelas PF já adiantam que o governador Marconi era chamado sempre de “o maior” pelos membros da quadrilha criminosa. Já Demóstenes continuou sendo chamado pela gang de “gordinho”, mesmo depois de emagrecer a custa de cirurgias.

Venda da casa de Marconi é uma incógnita
O Governador não consegue esclarecer sequer como foi a negociação da mansão que vendeu a Carlinhos Cachoeira – o bicheiro foi preso morando nela. Em princípio, Marconi alegou que o ex-vereador Wladmir Garcês era quem teria intermediado a venda para o bicheiro.
Agora, o Governador dá outra versão. Afirma que vendeu a mansão no ano passado para o dono da Faculdade Padrão, o empresário Valter Paulo Santiago, mas frisou que não o conhecia pessoalmente. É estranho, pois Valter Santiago foi contemplado pelo próprio Marconi com o título de Comendador de Goiás, em 2006, durante o segundo mandato do tucano.
Mais estranho o caso fica quando se sabe que a Faculdade Padrão, do novo comprador da casa de Marconi, recebe verbas do Estado pelo programa Bolsa Universitária. No site da instituição, é o próprio Valter Santiago quem incentiva os alunos a aderirem ao benefício concedido pelo Governador. O valor do imóvel também está sob suspeita.
Marconi vendeu a mansão por R$ 1,4 milhão, mas na sua declaração de bens ele declara que ela valia R$ 417 mil. Ou Marconi prestou declaração falsa a Receita Federal – o que configuraria crime de sonegação fiscal –, ou ele majorou o preço da casa em R$ 1 milhão ao vende-la, para o bicheiro Cachoeira, ou para o dono da Faculdade Padrão.

Mafioso dava ordens na Segurança Pública
O poder que o chefe da máfia do jogo ilegal exercia sobre a Polícia de Goiás no governo de Marconi Perillo fica evidente nas transcrições dos telefonemas interceptados pela Polícia Federal. Nesse esquema havia também a participação direta do ex-vereador Wladmir Garcês.
Numa das conversas Cachoeira manda Wladmir apurar com o corregedor-geral de Segurança Pública do Estado, Aredes Correia Pires e com Edmundo, uma possível operação policial que poderia acontecer contra os caça níquéis. “Vai lá no Aredes pra ver o que tá acontecendo”, ordena o bicheiro.
Wladmir, que chama o bicheiro de “chefe”, promete cumprir a ordem imediatamente. “É, tô indo aqui do Edmundo. Já tô chegando aqui. Vou ligar pro Aredes.” Logo depois, Wladmir informa Cachoeira sobre uma atuação policial na região de Valparaíso, no entorno de Goiás. Mas avisa que o assunto já foi contornado: “Não tem mais nenhuma ação prevista lá”.
O Edmundo citado por Cachoeira na ligação telefônica é identificado pela Polícia Federal como sendo o delegado Edemundo Dias Filho. Ele também é o tesoureiro do PSDB de Goiás. Para a PF, esse detalhe reforça os indícios de que o bicheiro jogou dinheiro na campanha de Marconi para governo do Estado.

 Empresa Delta recebe
dinheiro da Segurança
A empreiteira Delta, investigada pela PF, e onde Cachoeira e Wladmir Garcês mantinham sala e tinham acesso livre ao caixa da empresa, recebe R$ 3 milhões mensais pelo aluguel de veículos para a frota das polícias Militar e Civil, Batalhão Rodoviário do Estado, Corpo de Bombeiros, polícia técnica científica e Instituto Médico Legal. O contrato foi firmado em 2010 e vence no fim deste ano.
O Governador é citado em várias conversas telefônicas entre o bicheiro e figuras do comando da Polícia. Em um telefonema trocado com Cachoeira, Wladmir também cita o Governador, ao relatar um diálogo que tivera com o corregedor Aredes Pires sobre um processo de Edemundo.
Ele conta ao bicheiro que perguntou a Aredes se Edemundo não estaria preocupado com o processo, e Aredes teria lhe respondido: ‘Não tá nem um pouco preocupado. O governador disse que ia resolver para ele. Tá confiando no governador.”
O próprio corregedor Aredes Pires fala por telefone com Cachoeira e tenta tranquilizar o bicheiro sobre as possíveis ações policiais contra o jogo ilegal. Aredes, que também alega não conhecer Cachoeira, fala com ele ao telefone: “Eu tenho que conversar com o pessoal da inteligência de lá. Lá tem um grupo grande que tava fazendo o serviço. Mas num tá previsto pra esse final de semana, não tá”.

O cerco se fecha
Segundo a PF, o deputado federal Carlos Alberto Leréia, correligionário de Marconi Perillo, e um dos seus principais aliados políticos, emprestou até um avião para a quadrilha de Cachoeira fazer reunião em Brasília. Ele teve 70 conversas com o bicheiro interceptadas pela Polícia Federal e também é investigado por envolvimento no esquema do mafioso.
O secretário da Educação, Thiago Peixoto, também foi pego pela PF em escutas telefônicas arranjando um negócio vantajoso para Cachoeira. Thiago pretendia lançar escolas copiando prédios escolares da China. Mas em vez do Governo construir, iria alugar do bicheiro, que tinha inclusive o projeto do empreendimento, interrompido com a prisão dele.
Os grampos telefônicos mostram pedidos de Cachoeira por "varredura" no Detran de Goiás. Citado em escutas conversando com o bicheiro, Edivaldo Cardoso pediu demissão da presidência do Órgão. Sérgio Katayama e Eliane Pinheiro também caíram com a prisão do bicheiro. Carlinhos Cachoeira é hoje o criminoso mais temido por muitos políticos de Goiás.
A investigação da Polícia Federal e Ministério Público federal não deixa dúvidas sobre a intensa troca de favores entre os membros do grupo de Cachoeira, integrantes do governo Marconi e os parlamentares agora sob a mira do Supremo Tribunal Federal – STF.
É assustador o alcance dos tentáculos da organização criminosa comandada por Cachoeira e a influência dele na nomeação de dezenas de pessoas para ocupar funções públicas no Estado de Goiás” ( Juiz Paulo Augusto Moreira Lima, da 11ª Vara Federal de Goiânia, na sua sentença que determinou a prisão do bicheiro e seus cúmplices)

Cachoeira e Eliane, então chefe de gabinete de Marconi Perillo, conversam através de telefone Nextel. O bicheiro lhe pergunta. “Falou com o maior?” Eliane responde: “Falei, estou com ele aqui. Tá aqui”

Edivaldo Cardoso pediu demissão da presidência do Detran. Ele foi indicado para o cargo pelo grupo de Demóstenes Torres (sem partido). Cardoso é genro do ex-prefeito da Cidade de Goiás Boadyr Veloso, ex-sócio de Cachoeira, assassinado em 2008 quando deixava uma casa de jogos irregular

O secretário das Educação, Thiago Peixoto, também é citado no inquérito da Operação Monte Carlo que está desbaratando a quadrilha do bicheiro Carlinhos Cachoeira em Goiás

Cachoeira é casado com a ex-mulher do suplente do senador Demóstenes Torres, o empresário Wilder Pedro de Morais, secretário de Infraestrutura do governo Marconi Perillo

Dos contratos realizados nos últimos 13 meses entre a Delta e o Governo de Goiás, 11 deles foram com a Agetop, sob o comando de Jayme Rincón, apontado pela PF como um dos envolvidos com Cachoeira e cooptador de dinheiro para a campanha política de Marconi 

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