22 de agosto de 2015

Manifestantes querem Perillo fora do governo de Goiás


Não por acaso os goianos foram as ruas pedir o impeachment do governador Marconi Perillo (PSDB), sob gritos de “Fora Marconi, Goiás não tem dono”. O tucano é Acusado pela Polícia Federal de ter entregado o comando da Segurança Pública nas mãos do chefe da máfia dos caças níqueis e do jogo do bicho, Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira.
A carreira política de Marconi Perillo está na corda bamba desde a deflagração da Operação Monte Carlo, que culminou na prisão de Carlinhos Cachoeira – ele foi preso na casa que era do Governador –, e na cassação do mandato de senador de Demóstenes Torres.
No “Tempo Novo” do tucano Perillo, era Cachoeira quem dava as cartas em Goiás. A PF descobriu que o bicheiro nomeava e pagava mesada para delegados de polícia em troca de desenvolver livremente as suas atividades criminosas no Estado. Colocava parentes para ocupar cargos de primeiro escalão no Governo, a exemplo da Secretaria de Indústria e Comércio, e indicou até nome para a pró-reitoria da Universidade Estadual de Goiás (UEG).
Segundo o juiz Paulo Augusto Moreira Lima, da 11ª Vara Federal de Goiânia, que determinou a prisão do bicheiro, era assustador o alcance dos tentáculos da organização criminosa comandada por Cachoeira e a influência dele na nomeação de dezenas de pessoas para ocupar funções públicas no Estado.
Chefe da jogatina e comandante de um esquema criminoso que tinha Goiás como seu quartel general e se ramificava por outros estados, a exemplo do Tocantins, Cachoeira agia livremente em terras goianas, pela amizade que mantinha com o governador Perillo.
O ex-senador Demóstenes Torres era, declaradamente, amigão do peito do bicheiro preso pela Polícia Federal, de quem recebeu presentes caríssimos e importados. Demóstenes ocupou a Secretaria de Segurança Pública. Curiosamente, a área mais dominada por Cachoeira no governo de Goiás.
O Ministério Público Federal não calculou ainda o rombo financeiro que a atuação de Cachoeira provocou nos cofres do Estado. Mas já era esperado que a Operação Monte Carlo resultasse em muitos sepultamentos políticos.

Os afilhados de Don Corleone
Carlinhos Cachoeira comandava cassinos ilegais em Goiás e no entorno de Brasília, cada um com faturamento mensal em torno de R$ 3 milhões. Ele foi pego na Operação Monte Carlo, deflagrada pela Polícia Federal, em conjunto com o Ministério Público Federal e o Escritório de Inteligência da Receita Federal.
Até ser preso Cachoeira reinou impune 16 anos no Estado, onde posava de Don Corleone, o personagem fictício criado pelo escritor Mario Puzo e baseado na vida real de alguns integrantes da máfia siciliana.
Don Corleone é conhecido também como “o padrinho”, e Cachoeira apadrinhava muita gente do mundo político e empresarial de Goiás. Além de Perillo e Demóstenes, aparecem na lista de políticos amigos do bicheiro os deputados federais Carlos Alberto Leréia (PSDB), Jovair Arantes (PTB) e o ex-vereador Wladmir Garcês, preso junto com o padrinho mafioso.
As escutas telefônicas obtidas pela Polícia Federal deixam claro o poder do bicheiro sobre policiais militares, civis e federais de Goiás e a Justiça conclui que Cachoeira pode ser considerado o maior corruptor de agentes públicos encarregados da área de segurança no Estado.

Entenda a máfia goiana
Bem ao estilo do poderoso chefão da máfia siciliana, Carlinhos Cachoeira mandava e ingeria sistematicamente no governo tucano. A organização criminosa comandada por ele contava com sofisticado esquema de espionagem política e empresarial, obtidas por meio de interceptações telefônicas ilegais.
Segundo o procurador da República em Goiás, Daniel Resende Salgado, a quadrilha do bicheiro envolvia até contatos com jornalistas encarregados de divulgar conteúdos capazes de favorecer os interesses dos criminosos.
Policiais e militares goianos recebiam propinas regulares - semanais e mensais - para dar proteção aos exploradores da jogatina, vazar informações sobre ações repressivas e despistar as fiscalizações.
O valor da propina variava conforme a patente do militar ou a função do policial. As maiores fatias iam para os delegados, que recebiam até R$ 4 mil mensais. Um soldado ganhava entre R$ 180 e R$ 200 por dia de serviço para a organização. Já um sargento recebia diárias de R$ 300.
Entre os 35 mandados de prisão cumpridos em Goiás pela Polícia Federal durante a Operação Monte Carlo, foram presos servidores públicos, dois delegados da PF, seis da Polícia Civil do Estado, três tenentes, um capitão, dois sargentos, quatro cabos, um major e 18 agentes da Polícia Militar, além de um policial rodoviário federal, um auxiliar administrativo da PF de Brasília e um servidor da prefeitura de Valparaíso, cedido para a Justiça do Estado.

Carreira de crime
O delegado da Polícia Federal, Matheus Rodrigues, que coordenou a operação para prender o bicheiro e seus comparsas informa que os principais crimes atribuídos ao grupo são corrupção ativa e passiva, contrabando, lavagem de dinheiro, evasão de divisas, peculato, violação de sigilo e formação de quadrilha. O delito mais brando é o de exploração de jogo de azar.
O bicheiro foi pivô do primeiro escândalo do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), causado com a divulgação de um vídeo em que o então subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil, Waldomiro Diniz, negociava propina com o bicheiro em troca de apoio a aprovação de projetos de legalização de jogos de azar.
Waldomiro Diniz era presidente da Loterj – loteria do Rio de janeiro – e homem de confiança do ministro José Dirceu, cassado por envolvimento no escândalo do Mensalão. Diniz foi condenado a 12 anos de prisão por crime de corrupção passiva e ativa e pagamento de multa de R$ 170 mil. A sentença da juíza Maria Tereza Donatti, da 29ª Vara Criminal do Rio de Janeiro, saiu no mesmo dia que Cachoeira era preso em Goiânia.

Policiais fingiam trabalhar
Nos 16 anos que desenvolveu suas atividades ilegais em Goiás, Carlinhos Cachoeira jamais sofreu uma ação policial mais incisiva, porque policiais eram pagos por ele para que todas as tentativas de repressão resultassem em nada. Eles eram responsáveis por informar a organização criminosa sobre qualquer ação que seria feita contra o grupo.
Em alguns momentos, esses policiais até faziam pseudo-operações para tentar passar a população a sensação de que estavam combatendo o crime. Em 2006, uma tentativa de investigação terminou frustrada porque servidores mandados por Cachoeira fizeram uma operação tartaruga que impediu o êxito da operação.
Na organização do grupo, Cachoeira era quem concedia uma licença de exploração dos pontos a donos de galpões clandestinos em cidades de Goiás. Os policiais civis e militares a serviço da quadrilha criminosa fechavam os locais que não tinham o aval do chefe da organização.
O governador Marconi não deu nenhuma justificativa a sociedade sobre as denúncias feitas pela PF e Ministério Público Federal, dando conta de que ele entregou o comando da Segurança Pública para Carlinhos Cachoeira, chefe do crime organizado.

Yes, nós temos políticos honestos
Uma fonte da PF diz que as investigações continuam e que tentam descobrir que esquema Cachoeira utilizava para intermediar contratos de empresas junto ao Governo Marconi, como aconteceu no caso da  Delta Engenharia. A Polícia desconfia que Cachoeira é sócio informal dela no Estado.
A empreiteira, do carioca Fernando Cavendish, se instalou em Goiás em 2006. Naquele ano, faturou R$ 5,5 milhões do Estado. Hoje, os contratos da Delta já somam R$ 276 milhões e, além do Estado, abrangem diversas prefeituras, inclusive a de Goiânia. Cachoeira e Garcês, segundo a Polícia, mantinham salas dentro da empresa. A torre de babel começa a ruir para Marconi Perillo, que até agora permanecia ileso.
A prisão de Cachoeira desencadeou uma onda de sinceridade, e até de ingenuidade, nunca vista antes na historia dos políticos goianos. Geralmente envolvidos em escândalos de corrupção, e acostumados a engabelar o eleitor, de repente, todos os políticos afilhados do padrinho Don Corleone, resolveram falar com a imprensa. E mais: nem pestanejaram ou ficaram vermelhos para admitir que eram amigos íntimos do chefe de uma organização criminosa.
Talvez porque a PF e o MPF não deixaram dúvidas quanto as ligações suspeitas e perigosas, todos os políticos, como se tivessem feito um pacto, apresentaram justificativas quase idênticas, com exceção de Wladmir Garcês, que foi preso sem dizer uma palavra. Garcês lançou mão do seu último direito, o de permanecer calado.
Como se fosse correto, moral e ético um chefe de Estado negociar com um chefão do crime, o governador Marconi Perillo tentou se livrar da saia justa que foi o bandido ter sido preso na casa que até 2010 era dele, explicando que vendeu a casa para o bicheiro, mas quem intermediou o negócio foi Wladmir Garcês.
A onda repentina de sinceridade fez Marconi, sem querer, reforçar o elo de ligação que PF já sabia: Garcês é sócio e amigo do bicheiro, correligionário e amigo de Marconi, e fazia o papel de interlocutor entre o Governo e Cachoeira. Segundo a versão de Marconi, ele fez negócio com dois bandidos que foram presos pela Polícia Federal na Operação Monte Carlo.
De todas as justificativas, a mais engraçada, e ingênua, foi dada por Demóstenes Torres, que a época ocupava a presidência da Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Questionado pela imprensa, Demóstenes saiu-se com essa: “Eu pensei que ele (Cachoeira), tivesse abandonado o crime.” (sic).
Cachoeira só não se regenerou porque encontrou em Goiás o aparato necessário para continuar no crime e também porque o ex-senador, quando foi secretário de Segurança Pública, não conseguiu implantar o seu projeto de ressocialização de marginais. Uma pena.

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