15 de março de 2013

Deu zebra no jogo de Demóstenes Torres


Operação Monte Carlo
Acusado pela Polícia Federal de integrar a cúpula da máfia do jogo ilegal em Goiás, o senador Demóstenes Torres (DEM) teria faturado R$ 50 milhões da organização criminosa chefiada pelo amigo dele,Carlinhos Cachoeira. Segundo a PF, o democrata ficava com 30% da arrecadação e pretendia jogar o dinheiro como caixa dois numa futura campanha para governador do Estado


Depois de nadar de braçada nas águas turvas, e milionárias, do mafioso Carlos Augusto de Almeida Ramos, o Carlinhos Cachoeira, o senador Demóstenes Torres (DEM) afunda num mar de corrupção sem precedentes na história do Senado. Em Brasília, ninguém mais aposta um centavo numa possível inocência do democrata e a cassação do seu mandato virou questão de honra para o Congresso Nacional.
Segundo a Polícia Federal, Demóstenes Torres faturava 30% do que era arrecadado pela máfia dos caça níquéis e do jogo do bicho em Goiás. Como o esquema arrecadou cerca de R$ 170 milhões nos últimos seis anos, a PF calcula que Demóstenes embolsou, nesse curto período, a fortuna de R$ 50 milhões.
No bando de Carlinhos Cachoeira, o senador era o número 1 no “seleto” grupo dos 14 homens que formavam a cúpula comandada pelo bicheiro. Os R$ 50 milhões que ele recebeu de Cachoeira seriam usados como caixa dois numa futura campanha para governador de Goiás, afirma a PF.
O lucrativo jogo do bicho de Demóstenes só deu zebra depois que a Operação Monte Carlo, deflagrada pela PF e Ministério Público Federal, desbaratou aquadrilha e revelou os estreitos laços de amizade que o senador mantinha com Cachoeira. O contraventor continua preso em Mossoró, no Rio Grande do Norte.
Demóstenes não está sozinho na corda bamba que virou o seu futuro político. Também são acusados de envolvimentos suspeitos com o Don Corleone de Goiás o governador Marconi Perillo (PSDB) e os deputados federais Carlos Alberto Leréia (PSDB), Jovair Arantes (PTB), Sandes Júnior(PP) e Rubens Otoni (PT). Até agora.
Marconi Perillo é acusado pela Operação Monte Carlo de ter entregado o comando do Estado para o chefe da quadrilha criminosa. Estranhamente, ele parece estar sendo poupado e ainda não explicou a PF ao MPF por que o bicheiro lhe mandava nomear e exonerar delegados e dava ordens em todos os outros setores da administração tucana.

Delegado preso entrega Demóstenes
Desde que foi desmascarado na Operação Monte Carlo, Demóstenes Torres adotou a linha do “eu não sabia”, “ele é bandido?!”, “ninguém me contou”,“só fiquei sabendo agora”. Essa tática ele usou ao ser questionado sobre a ligação com Cachoeira e os presentes caros que recebia do contraventor: “Eu pensei que ele(Cachoeira) tivesse abandonado o crime”. (sic!)
O castelo de areia de Demóstenes, já com as estruturas abaladas, ruiu de vez quando o MPF descobriu três relatórios elaborados pelo delegado da PF, Deuselino Valadares dos Santos, preso junto com o bicheiro. Nos documentos, o delegado relata que 50% da arrecadação do jogo clandestino iam para Carlinhos Cachoeira e 30% eram entregues a Demóstenes Torres.
De posse do dinheiro, o senador tinha a obrigação de remunerar também o então superintende de Loterias da Agência Goiânia de Administração – Aganp, Marcelo Siqueira. Ex-procurador, Siqueira assumiu o cargo por indicação de Demóstenes e do deputado Leréia,também investigado pela PF.
A revelação é apocalíptica para as pretensões políticas de Demóstenes e explica por que a organização criminosa agia livremente em Goiás, no entorno de Brasília e em mais cinco estados, incluindo o vizinho Tocantins: O delegado Deuselino Valadares descobriu o esquema em 2006, mas preferiu ser comprado pelo bicheiro a enviar para a Justiça o que descobriu nas investigações.

Pego pela ambição
As descobertas feitas pelo delegado Deuselino Tavares estão num Relatório Sigiloso de Análise da Operação Monte Carlo, sob os cuidados do Núcleo de Inteligência Policial da Superintendência da PF em Brasília.
O delegado foi preso, mas antes disso usou as informações obtidas para fazer o seu pé demeia. Ele comprou fazendas no Tocantins e montou, em sociedade com Cachoeira, a empresa Ideal Segurança Ltda., registrada em nome da mulher, Luanna Bastos Pires Valadares. A firma era usada para lavagem de dinheiro.
Afastado da PF desde o ano passado, o delegado, que foi o responsável por investigar o escândalo da Avestruz Master tinha, dentro da gang de Cachoeira, a tarefa de informar aquadrilha sobre as ações que a Polícia pretendia adotar contra o jogo do bicho e os caça níquéis.

Ironicamente, foi o relatório do delegado Deuselino Tavares que esclareceu a ligação íntima de Demóstenes com Cachoeira, estreita a ponto deles se falarem por telefone 298 vezes em menos de um ano. Por causa de riqueza que crescia rapidamente, Deuselino foi afastado das funções de delegado, no ano passado. De investigador, passou a ser investigado e já começou, ainda que a revelia, denunciar os cúmplices.

O alto preço do senador
Demóstenes Torres custou muito caro a quadrilha,onde ficava com 30% da arrecadação, aos promotores de Justiça de Goiás, hoje constrangidos com a desonestidade do ex chefe do Ministério Público Estadual; ao Senado, que não vê a hora de cassar o mandato do parlamentar e ao próprio DEM, que quer livra-se do“incômodo”, como definiu o escândalo o presidente do partido,
Parece ser desmedida a ambição de Demóstenes. Além de faturar cerca de R$ 50 milhões em seis anos – esse deve ser o maior prêmio já pago em caça níquéis e jogo do bicho –, o senador recebeu de presente de casamento de Cachoeira uma geladeira e um fogão importados, avaliados em quase R$ 50 mil.
Numa outra conversa, intitulada pela PF “Carlinhos oferece aeronave para Demóstenes” Cachoeira avisa ao senador que “o avião já está aí, já está te esperando”. Demóstenes recebia presentes caríssimos de Cachoeira, mas privilegiava o mafioso com informações das conversas sigilosas que tinha em reuniões nas esferas do Legislativo, Executivo e Judiciário.
O senador foi pego numa escuta telefônica pedindo a Cachoeira R$ 3 mil para pagar despesas com taxi aéreo. Até o seu tablet ipad quebrado – o produto custa em média, R$ 2 mil –, Cachoeira teve de comprar outro e enviar a Demóstenes como mais “um presente”.
A Polícia Federal descobriu que Demóstenes ganhou de presente do “professor” Cachoeira um rádio Nextel comprado nos Estados Unidos e habilitado em Miami. Além de chique, importado, o aparelho servia para tentar impedir as escutas do grampo telefônico da Polícia Federal.

O governo de Cachoeira
 abraçava todo o Estado
No relatório do Ministério Público Federal, composto de 859 páginas, está cristalino o governo paralelo de Carlinhos Cachoeira em Goiás. Nas transcrições dos diálogos que ele mantém com seus comparsas, e subordinados, a exemplo do ex-vereador Wladmir Garcês, o bicheiro é chamado sempre de “capitão” ou“professor'”, como preferia o senador Demóstenes.
Nos Autos de número 13279-78.2011.4.01.3550, da 11ª Varada Justiça em Goiás, estão as transcrições das conversas revelando os pagamentos de propinas que Cachoeira fazia para dezenas de funcionários públicos de Goiás, principalmente no âmbito de segurança Pública.
O delegado da Polícia Federal, Deuselino Tavares, chamado de Neguinho nas conversas interceptadas pela PF, também era bancado pelo chefe da máfia do jogo clandestino no Estado. O relatório do MPF diz que ele usou dinheiro sujo da gang para comprar a empresa Ideal Segurança Ltda..
Cópias da movimentação bancária de Cachoeira mostram que o delegado pegava propina que variavam de R$ 20 mil a R$ 80 mil. Enquanto isso, o tenente coronel Deovandir Frazão recebia R$ 3 mil por mês para fazer vistas grossas a atuação da quadrilha em Águas Lindas, no entorno de Brasília.


O relatório, de 859 páginas, da PF e MPF, demonstra o poder de fogo do bicheiro Carlinhos Cachoeira em todos os segmentos do governo de Goiás. Do seu jeito torto, a margem da lei, o mafioso comandou o Estado ao lado do tucano Perillo

Cachoeira denominava as propinas pagas as autoridades de “assistência social”. Num momento em que faltou dinheiro, o mafioso ordenou:“Paga o pessoal da assistência social primeiro e empurra o pagamento das cartelas (de jogo) pra depois”

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